segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Caracterização do Texto Literário



Mais do que simplesmente "linguagem" ou uma forma de usar as palavras, o que faz um texto ser "literário" ou não depende mais da forma em que as pessoas ou uma sociedade em geral se dispõem a ler um texto.

Um texto científico pode usar metáforas, assim como uma receita de bolos pode usar rimas (dois recursos linguísticos que são considerados literários). Mas o que irá definir se um texto é considerado literário ou não será a disposição do leitor em ler o texto de forma "literária" - de considerar todos os sentidos possíveis, todas as conotações das palavras, todos os duplos sentidos, as inferências, etc. de um determinado texto.

Portanto, existem inúmeros recursos estilísticos (como figuras de linguagem, rimas etc.) que são usados em textos literários, mas não será apenas isso que definirá um texto como literário ou não.

Num texto não-literário, o leitor vai considerar apenas o sentido óbvio daquilo que está escrito, não vai ficar imaginando se têm outras possibilidades de interpretação, como a gente faz com os textos que consideramos literatura.

Enfim, as figuras de linguagem, o ritmo, a rima, a versificação, são mais usados em textos literários. Mas, apesar disso, também podem ser usados em textos não-literários, embora geralmente sejam usados muito menos.

Relacionando o texto literário ao não-literário, devemos considerar que o texto literário tem uma dimensão estética, plurissignificativa e de intenso dinamismo, que possibilita a criação de novas relações de sentido, com predomínio da função poética da linguagem. É, portanto, um espaço relevante de reflexão sobre a realidade, envolvendo um processo de recriação lúdica dessa realidade. No texto não-literário, as relações são mais restritas, tendo em vista a necessidade de uma informação mais objetiva e direta no processo de documentação da realidade, com predomínio da função referencial da linguagem, e na interação entre os indivíduos, com predomínio de outras funções.

1.1 A produção de um texto literário implica:
· a valorização da forma
· a reflexão sobre o real
· a reconstrução da linguagem
· a plurissignificação
· a intangibilidade da organização lingüística

Ao ler um texto literário ou ficcional , temos de levar em conta as relações entre as figuras da enunciação que participam deles. Cada uma dessas figuras tem um lugar e um papel na produção de sentido do texto.

AUTOR Empírico -> Enunciador -> Locutor
. É a voz que se manifesta no texto( o narrador, o sujeito poético, o eu-lírico, etc.).
. Pode dar a palavra a outros locutores secundários.
. Assume um ponto de vista de enunciação( enunciador).
. Não se confunde com o autor real.
. É a máscara linguística desse enunciador dentro do texto.

TEXTO
. Tecido verbal
. Enunciado
. Produto da enunciação
. Conjunto de formas linguísticas que materializam o universo criado.

LEITOR empírico -> Destinatário -> Alocutário
. Leitor previsto ou representado no texto pelo locutor.
. Às vezes, o locutor dialoga com esse leitor.
. Pode ser inferido a partir da fala do locutor.

Caracterização da Literatura

Literatura pode ser definida como a arte de criar e recriar textos ,de compor ou estudar escritos artísticos; o exercício da eloquência e da poesia; o conjunto de produções literárias de um país ou de uma época; a carreira das letras.

A palavra Literatura vem do latim "litterae" que significa "letras", e possivelmente uma tradução do grego "grammatikee". Em latim, literatura significa uma instrução ou um conjunto de saberes ou habilidades de escrever e ler bem, e se relaciona com as artes da gramática, da retórica e da poética. Por extensão, se refere especificamente à arte ou ofício de escrever de forma artística. O termo Literatura também é usado como referência a um corpo ou um conjunto escolhido de textos como, por exemplo, a literatura médica, a literatura inglesa, literatura portuguesa, etc.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Intertextualidade...uma constante na Literatura

Intertextualidade:

A palavra intertextualidade significa interação entre textos, um diálogo entre eles. E texto no sentido amplo: um conjunto de signos organizados para transmitir uma mensagem, portanto, no mundo atual da multimídia, ela acontece entre textos de signos diferentes.

Para que mentir?

Para que mentir
tu ainda não tens
Esse dom de saber iludir?
Pra quê? Pra que mentir,
Se não há necessidade
De me trair?

Pra que mentir
Se tu ainda não tens
A malícia de toda mulher?
Pra que mentir, se eu sei
Que gostas de outro
Que te diz que não te quer?

Pra que mentir tanto assim
Se tu sabes que eu sei
Que tu não gostas de mim?
Se tu sabes que eu te quero
Apesar de ser traído
Pelo teu ódio sincero
Ou por teu amor fingido?
(Vadico e Noel Rosa, 1934)

Dom de Iludir

Não me venha falar na malícia
de toda mulher
Cada um sabe a dor e a delícia
de ser o que é.
Não me olhe como se a polícia
andasse atrás de mim.
Cale a boca, e não cale na boca
notícia ruim.
Você sabe explicar
Você sabe entender, tudo bem.
Você está, você é, você faz.
Você quer, você tem.
Você diz a verdade, a verdade
é seu dom de iludir.
Como pode querer que a mulher
vá viver sem mentir.
(Caetano Veloso, 1982)

Tipos de entertextualidades

Citação

É uma transcrição de texto alheio, marcada por aspas. A música Cinema Novo, de Caetano Veloso, faz citações:

O filme quis dizer ‘Eu sou o samba’
A voz do morro rasgou a tela do cinema
E começaram a se configurar
Visões das coisas grandes pequenas
Que nos formaram e estão a nos formar
Todos e muitos: Deus e o Diabo, Vidas Secas, os Fuzis,
Os Cafajestes, o Padre e a Moça, a Grande Feira, o Desafio
Outras conversas, outras conversas sobre os jeitos do Brasil.

Na citação sobre o samba, Caetano Veloso diz que o Cinema Novo quer representar o Brasil, como fez o samba da época de Cármen Miranda.

Referência e Alusão

Machado de Assis é mestre nesse tipo de intertextualidade. Ele foi um escritor que visualizou o valor desse artifício no romance bem antes do Modernismo. No romance Dom Casmurro, ele cita Otelo, personagem de Shakespeare, para que o leitor analise o drama de Bentinho.

Paráfrase

A paráfrase é a reprodução do texto de outrem com as palavras do autor. Ela não confunde com o plágio porque seu autor explicita a intenção, deixa claro a fonte. Exemplo de paráfrase é o poema Oração, de Jorge de Lima:

“- Ave Maria cheia de graças...”
A tarde era tão bela, a vida era tão pura,
as mãos de minha mãe eram tão doces,
havia, lá no azul, um crepúsculo de ouro... lá longe...
“- Cheia de graça, o Senhor é convosco, bendita!”
Bendita!
Os outros meninos, minha irmã, meus irmãos
menores,
meus brinquedos, a casaria branca de
minha terra, a burrinha do vigário
pastando
junto à capela... lá longe...
Ave cheia de graça
- ...”bendita sois entre as mulheres, bendito é o
fruto do vosso ventre...”
E as mãos do sono sobre os meus olhos,
e as mãos de minha mãe sobre o meu sonho,
e as estampas de meu catecismo
para o meu sonho de ave!
E isto tudo tão longe... tão longe...

O autor retoma explicitamente a oração Ave Maria e mantém-se fiel a ele, justapõe a figura de Maria à da sua mãe, refere-se à hora do Angelus.

Paródia

“A paródia é uma forma de apropriação que, em lugar de endossar o modelo retomado, rompe com ele, sutil ou abertamente”.
Ela acontece no famoso poema de Carlos Drummond de Andrade No Meio do Caminho, que faz uma paródia do soneto Nel Mezzo del Camin, de Olavo Bilac que, por sua vez, remete ao primeiro verso da Divina Comédia, de Dante Alighiere: "Nel mezzo del camin de nostra vita".
Além do título, Drummond imitou o esquema retórico do soneto de Bilac, ou seja, em vez de parodiar o significado, promoveu um paródia na forma: empenhou-se na imitação irônica da estrutura, reproduzindo apenas o quiasmo (repetição invertida) do texto.

No Meio do Caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nel Mezzo del Camin
Olavo Bilac

Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha...
E paramos de súbito na estrada
Da vida: longos anos, presa à minha
A tua mão, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.
Hoje, segues de novo... Na partida
Nem o pranto os teus olhos umedece,
Nem te comove a dor da despedida.
E eu, solitário, volto a face, e tremo,
Vendo o teu vulto que desaparece
Na extrema curva do caminho extremo.

Intertextualidade implícita.

Quando uma articulista de jornal escreve sobre a importância dos direitos huma-nos na atualidade, suas idéias fazem parte de um discurso ideológico, portanto, com certeza, seu texto mantém diálogo implícito (ou explícito) com a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU e outros documentos.

Na Literatura, a intertextualidade é uma constante, porque cada estilo de época se opõe ao anterior e retoma parte da estética passada. Exemplos: o Classicismo retomou a Antigüidade Clássica, assim fez também o Arcadismo e o Parnasianismo. O Realismo combatia os excessos do Romantismo, já este contrariava o formalismo dos clássicos.
O soneto de Antero de Quental é uma evidência de como uma corrente literária se contrapõe à outra. “Mais Luz” é uma crítica explícita aos poetas românticos:

Mais luz!
Antero de Quental

Amem a noite os magros crapulosos,
E os que sonham com virgens impossíveis,
E os que se inclinam, mudos e impassíveis,
À borda dos abismos silenciosos...
Tu, Lua, com teus raios vaporosos,
Cobre-os, tapa-os e torna-os insensíveis,
Tanto aos vícios cruéis e inextinguíveis
Como aos longos cuidados dolorosos!
Eu amarei a santa madrugada,
E o meio-dia, em vida refervendo,
E a tarde rumorosa e repousada.
Viva e trabalhe em plena luz: depois,
Seja-me dado ainda ver, morrendo,
O claro Sol, amigo dos heróis!

Nesse caudal de retomada e oposição, acontece a intertextualidade que forma a histó-ria da literatura de uma nação. João Cabral de Melo Neto tem um poema que ilustra muito bem esse fenômeno com a metáfora do cantar dos galos:

Tecendo a manhã
João Cabral de Melo Neto
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, todo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

Quando se vê um (a) jovem tentando rabiscar um poema, espremendo os miolos para colocar no papel a sua subjetividade trabalhada em forma de palavras, qualquer escritor se encanta, pois é mais um que quer ser água no rio caudaloso da literatura. Camões, Machado de Assis sorriem porque com esse gesto não deixa a literatura morrer. Intertextualidade também é isso: os cantares de cada geração dialogando entre si.

Exemplos de intertextualidade - Canção do exílio :

Mário Quintana
Minha terra não tem palmeiras...
E em vez de um mero sabiá,
Cantam aves invisíveis
Nas palmeiras que não há.

Oswald de Andrade
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo.

Tom Jobim e Chico Buarque
Vou voltar, sei que ainda
Vou voltar para o meu lugar
Foi lá e ainda lá
Que eu hei de ouvir cantar
Uma sabiá, cantar uma sabiá.
Carlos Drummond de Andrade:
Um sabiá
Na palmeira, longe.
Estas aves cantam
Um outro canto
(...)
Só, na noite,
Seria feliz:
Um sabiá
Na palmeira, longe.
Joaquim Osório Duque Estrada
Do que a terra mais garrida
Teus risonhos, lindos campos têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida
Nossa vida, no teu seio, mais amores.

Caso do Vestido
Carlos Drummond de Andrade


Nossa mãe, o que é aquele
vestido, naquele prego?
Minhas filhas, é o vestido
de uma dona que passou.
Passou quando, nossa mãe?
Era nossa conhecida?
Minhas filhas, boca presa.
Vosso pai evém chegando.
Nossa mãe, dizei depressa
que vestido é esse vestido.
Minhas filhas, mas o corpo
ficou frio e não o veste.
O vestido, nesse prego,
está morto, sossegado.
Nossa mãe, esse vestido
tanta renda, esse segredo!
Minhas filhas, escutai
palavras de minha boca.
Era uma dona de longe,
vosso pai enamorou-se.
E ficou tão transtornado,
se perdeu tanto de nós,
se afastou de toda vida,
se fechou, se devorou,
chorou no prato de carne,
bebeu, brigou, me bateu,
me deixou com vosso berço,
foi para a dona de longe,
mas a dona não ligou.
Em vão o pai implorou.
Dava apólice, fazenda,
dava carro, dava ouro,
beberia seu sobejo,
lamberia seu sapato.
Mas a dona nem ligou.
Então vosso pai, irado,
me pediu que lhe pedisse,
a essa dona tão perversa,
que tivesse paciência
e fosse dormir com ele...
Nossa mãe, por que chorais?
Nosso lenço vos cedemos.
Minhas filhas, vosso pai
chega ao pátio. Disfarcemos.
Nossa mãe, não escutamos
pisar de pé no degrau.
Minhas filhas, procurei
aquela mulher do demo.
E lhe roguei que aplacasse
de meu marido a vontade.
Eu não amo teu marido,
me falou ela se rindo.
Mas posso ficar com ele
se a senhora fizer gosto,
só pra lhe satisfazer,
não por mim, não quero homem.
Olhei para vosso pai,
os olhos dele pediam.
Olhei para a dona ruim,
os olhos dela gozavam.
O seu vestido de renda,
de colo mui devassado,
mais mostrava que escondia
as partes da pecadora.
Eu fiz meu pelo-sinal,
me curvei... disse que sim.
Sai pensando na morte,
mas a morte não chegava.
Andei pelas cinco ruas,
passei ponte, passei rio,
visitei vossos parentes,
não comia, não falava,
tive uma febre terçã,
mas a morte não chegava.
Fiquei fora de perigo,
fiquei de cabeça branca,
perdi meus dentes, meus olhos,
costurei, lavei, fiz doce,
minhas mãos se escalavraram,
meus anéis se dispersaram,
minha corrente de ouro
pagou conta de farmácia.
Vosso pais sumiu no mundo.
O mundo é grande e pequeno.
Um dia a dona soberba
me aparece já sem nada,
pobre, desfeita, mofina,
com sua trouxa na mão.
Dona, me disse baixinho,
não te dou vosso marido,
que não sei onde ele anda.
Mas te dou este vestido,
última peça de luxo
que guardei como lembrança
daquele dia de cobra,
da maior humilhação.
Eu não tinha amor por ele,
ao depois amor pegou.
Mas então ele enjoado
confessou que só gostava
de mim como eu era dantes.
Me joguei a suas plantas,
fiz toda sorte de dengo,
no chão rocei minha cara,
me puxei pelos cabelos,
me lancei na correnteza,
me cortei de canivete,
me atirei no sumidouro,
bebi fel e gasolina,
rezei duzentas novenas,
dona, de nada valeu:
vosso marido sumiu.
Aqui trago minha roupa
que recorda meu malfeito
de ofender dona casada
pisando no seu orgulho.
Recebei esse vestido
e me dai vosso perdão.
Olhei para a cara dela,
quede os olhos cintilantes?
quede graça de sorriso,
quede colo de camélia?
quede aquela cinturinha
delgada como jeitosa?
quede pezinhos calçados
com sandálias de cetim?
Olhei muito para ela,
boca não disse palavra.
Peguei o vestido, pus
nesse prego da parede.
Ela se foi de mansinho
e já na ponta da estrada
vosso pai aparecia.
Olhou pra mim em silêncio,
mal reparou no vestido
e disse apenas: — Mulher,
põe mais um prato na mesa.
Eu fiz, ele se assentou,
comeu, limpou o suor,
era sempre o mesmo homem,
comia meio de lado
e nem estava mais velho.
O barulho da comida
na boca, me acalentava,
me dava uma grande paz,
um sentimento esquisito
de que tudo foi um sonho,
vestido não há... nem nada.
Minhas filhas, eis que ouço
vosso pai subindo a escada.


O Filme


Como qualquer projeto encomendado, O vestido poderia ter resultado artificial ou forçado, mas não. Retrata o encontro entre duas almas mineiras de tempos e lugares diversos, irmanados, porém,
pela palavra poética franca e madura. O vestido é mergulho literário profundo e suave, de
sensações à flor da pele.

Duas meninas descobrem no porão da casa, um velho e lindo vestido de festa. Querem saber corno foi parar ali, principalmente depois que viram sua mãe chorando com o mesmo entre as mãos.
Iniciam assim, uma investigação. Ainda mais: por que sempre à mesa, nas refeições, havia um
prato reservado ao pai, que as havia abandonado há muitos anos?

Ângela, uma bela mulher de 33 anos decide revelar o mistério às filhas e contar-lhes suas angústias
e sofrimento, que começaram quando ela, ingenuamente, presenteou a outra mulher o vestido que seu marido havia lhe dado de presente.
Na Festa de Final de Ano, no clube da cidade, ante a sociedade local, a tal mulher se apresenta exuberante e usando o vestido, seduzindo definitivamente o marido de Ângela

A história foi filmada por Paulo Thiago, com a atriz Gabriela Duarte no papel principal
O diretor diz que inicialmente pensou em situar a história nos anos 50, mas que optou por trazê-la para os dias atuais, preservando, no entanto, muitos de seus aspectos arcaicos, por isso, boa parte
da história foi filmada na cidade histórica de Sabará, onde a arquitetura barroca convive com uma modernidade "contaminada" pelo caos urbano.

Este dado difere do trabalho de Herculano que preferiu manter-se fiel ao tempo do poema e situar
a ação do romance nos anos 40, no Vale do Jequitinhonha, uma das regiões mais belas e mais
pobres do Brasil.

sábado, 15 de agosto de 2009

Clarice Lispector

Clarice Lispector, nascida Haia Lispector (Chechelnyk, 10 de dezembro de 1920 — Rio de Janeiro, 9 de dezembro de 1977) foi uma escritora brasileira, nascida na Ucrânia.
De origem judaica, terceira filha de Pinkouss e de Mania Lispector. A família de Clarice sofreu a perseguição aos judeus, durante a Guerra Civil Russa de 1918-1921. Seu nascimento ocorreu em Chechelnyk, enquanto percorriam várias aldeias da Ucrânia, antes da viagem de emigração ao continente americano. Aportaram no Brasil quando tinha pouco mais de um ano de idade.

Autora de linha introspectiva, buscava exprimir, através de seus textos, as agruras e antinomias do ser. Suas obras caracterizam-se pela exacerbação do momento interior e intensa ruptura com o enredo factual, a ponto de a própria subjetividade entrar em crise.

Além de escritora, Clarice foi colunista do Jornal do Brasil, do Correio da Manhã e Diário da Noite. As colunas, que foram publicadas entre as décadas de 60 e 70, eram destinadas ao público feminino, e abordavam assuntos como dicas de beleza, moda e comportamento. Em meados de 1970, Lispector começou a trabalhar no livro Um sopro de vida: pulsações, publicado postumamente. Este livro consiste de uma série de diálogos entre o "autor" e sua criação, Angela Pralini, personagem cujo nome foi emprestado de outro personagem de um conto publicado em Onde estivestes de noite. Esta abordagem fragmentada foi novamente utilizada no seu penúltimo e, talvez, mais famoso romance, A hora da estrela. No romance, Clarice conta a história de Macabéa, uma datilógrafa criada no estado de Alagoas que migra para o Rio de Janeiro e vai morar em uma pensão, tendo sua rotina narrada por um escritor fictício chamado Rodrigo S.M. O livro descreve a pobreza e a marginalização no Brasil, temática que pouco aparece ao longo da sua obra. A história de Macabéa foi publicada poucos meses antes da morte de Clarice.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

João Guimarães Rosa


João Guimarães Rosa

Nasceu em Cordisburgo (MG) a 27 de junho de 1908 e era o primeiro dos seis filhos de D. Francisca (Chiquitinha) Guimarães Rosa e de Florduardo Pinto Rosa, mais conhecido por "seu Fulô".
Autodidata, começou ainda criança a estudar diversos idiomas, iniciando pelo francês quando ainda não tinha 7 anos.

Contista, novelista, romancista e diplomata, faleceu no Rio de Janeiro/RJ em 19 de novembro de 1967.Foi um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Foi também médico e diplomata.

Os contos e romances escritos por João Guimarães Rosa ambientam-se quase todos no chamado sertão brasileiro. A sua obra destaca-se, sobretudo, pelas inovações de linguagem, sendo marcada pela influência de falares populares e regionais. Tudo isso, somado a sua erudição, permitiu a criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e palavras populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas.


Realismo mágico, regionalismo, liberdades e invenções lingüísticas e neologismos são algumas das características fundamentais da literatura de Guimarães Rosa, mas não as suficientes para explicar seu sucesso.

Guimarães Rosa prova o quão importante é ter a linguagem a serviço da temática, e vice-versa, uma potencializando a outra. Nesse sentido, o escritor mineiro inaugura uma metamorfose no regionalismo brasileiro que o traria de novo ao centro da ficção
brasileira.

Obras
1936: Magma
1946: Sagarana
1947: Com o Vaqueiro Mariano
1956: Corpo de Baile
1956: Grande Sertão: Veredas
1962: Primeiras Estórias
1964: Campo Geral
1965: Noites do Sertão
1967: Tutaméia – Terceiras Estórias
1969: Estas Estórias (póstumo)
1970: Ave, Palavra (póstumo)




"Quando escrevo, repito o que já vivi antes.
E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente.
Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo

vivendo no rio São Francisco.Gostaria de ser
um crocodilo porque amo os grandes rios,
pois são profundos como a alma de um homem.
Na superfície são muito vivazes e claros,
mas nas profundezas são tranqüilos e escuros
como o sofrimento dos homens."





domingo, 9 de agosto de 2009

Imagem da conto O menino presente mo livro Antes do Baile verde de Lygia Fagundes Telles

sábado, 8 de agosto de 2009

Antes do Baile Verde - Lygia Fagundes Teles




Antes do baile verde, livro de contos de Lygia Fagundes Telles, publicado em 1970, é uma das obras mais marcantes da carreira da autora. Os contos inseridos nesta coletânea foram escritos entre 1949 e 1969. Nesse sentido, um pensamento inicial pode recair sobre o questionamento de haver ou não evolução qualitativa e conseqüente amadurecimento do autor, resultantes de vinte anos de investida criativa.Os temas são considerados o ponto forte deste trabalho de Lygia, principalmente ao se observar o período em que foi concebido. Adultério, insatisfação conjugal, desmistificação dos papéis familiares – talvez possam ser considerados temas banais, exaustivamente explorados. Entretanto, a autora abordou-os há meio século, época em que a família conjugal é o modelo dominante e que a autoridade máxima na família é conferida ao pai, o chefe da casa, “e garantida pela legislação que incentiva o moralismo tradicional, a ‘procriação’, o trabalho masculino e a dedicação da mulher ao lar”.A narrativa de Lygia apresenta grande agilidade. A autora utiliza linguagem clara, concisa, descartando tudo o que poderia ser considerado desnecessário para a ficção.
Na introdução de Antes do baile verde, a autora explora obstinadamente o desencontro das personagens, expõe a face dramática das fraquezas humanas, veda os caminhos da redenção. São trechos levam o leitor a refletir sobre as inquietações do ser humano, colocando-o frente à frente com as aflições do cotidiano, fazendo-o sofrer com o desajuste e o desamor vividos pelas personagens

O menino

A família apresentada por Lygia Fagundes Telles neste conto é constituída pelo pai – referido como “doutor” –, o “chefe de família” que passa o dia trabalhando e volta à noite para o lar; a mãe, jovem e bonita, a “rainha do lar”, e um único filho (o que era típico das famílias de classe média da época). Na casa trabalha uma empregada doméstica.
As personagens saem de casa e encaminham-se para o cinema. Mãe e filho percorrem o trajeto a pé, de mãos dadas. A mulher anda apressadamente, o menino fala sem parar.Durante a caminhada até o cinema, o menino sente-se orgulhoso por estar ao lado da mãe, quer exibi-la aos colegas. Delicia-se porque a mãe de Júlio é “grandalhona e sem graça, sempre de chinelo e consertando meia”. Nesta parte do conto, tem-se o auge da felicidade do menino.
Ao chegar ao cinema, a mãe passa a se comportar de forma estranha, incompreensível. A mulher perde toda a pressa, o filme já começou e ela não quer entrar na sala de projeção e, quando finalmente se decide, escolhe um dos piores lugares. O menino fica irritado, não consegue entender-lhe o comportamento. Na escolha dos lugares, mais um índice de antecipação de desfecho: se eles são apenas dois, porque ela indica para o filho “os três lugares vagos quase no fim da fileira”? Um homem chega e senta-se na poltrona vazia, ao lado da mãe. O menino não pode mais trocar de lugar. “Agora é que não restava mesmo nenhuma esperança”.A mãe explica a história do filme ao filho. O leitor percebe, então, que a mulher já conhece o filme – ela mentiu para o filho ao afirmar que não sabia qual a fita que iriam assistir. A atitude da mãe foi de dissimulação, justificada pelo motivo que a leva ao cinema (seria preferível ir à projeção de um filme já conhecido). Além disso, ela queria a companhia do filho – o menino serve como um álibi – e, assim, não revela que estão indo ver um filme de amor (para não correr o risco do menino recusar-se a acompanhá-la). Ela é uma mulher astuta, articula o plano pensando em todos os detalhes.
É justamente neste ponto da narrativa que se chega ao clímax. Ocorre o impacto da descoberta: “Então viu: a mão pequena e branca, muito branca, deslizou pelo braço da poltrona e pousou devagarinho nos joelhos do homem que acabara de chegar”. No instante em que o homem se levanta para ir embora, o menino sente vontade de enfrentá-lo. “Fechou os punhos. ‘Eu pulo no pescoço dele, eu esgano ele! ’”. Quer brigar com o homem, mas percebe que não pode. O menino sente-se impotente. “Aquele contato foi como ponta de um alfinete num balão de ar. (...). Encolheu-se murcho no fundo da poltrona e pendeu a cabeça para o peito”.
Ao entrar em casa, o menino entra em pânico, acha que alguma coisa terrível vai acontecer, mas tudo está normal, como sempre. No desfecho do conto, o menino não toma nenhuma atitude, não conta o que aconteceu, não denuncia o “adultério” da mãe. Identificase com o homem, sente a sua dor: ambos foram traídos. Tudo permanece aparentemente como antes – só quem sente a mudança e a dor que ela traz é o menino.O conto O Menino pode ser considerado uma narrativa de aprendizagem. O protagonista passa por uma experiência dolorosa, que faz com que perca a inocência típica da criança e, além disso, veja ruir a imagem da mãe, o ídolo que adorara até então. O início do amadurecimento é acompanhado pela necessidade de também aprender a usar as máscaras sociais que todos usam, no dia a dia: assim, o menino omite os acontecimentos, não os revela para o pai.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Vanguardas Poéticas




Poema Processos


Designação dada à manifestação estética, surgida em 1967, no Rio de Janeiro, que se opunha radicalmente à discursividade da poesia. Esse novo movimento propunha a criação de uma poesia que podia nem mesmo ter palavras, atribuindo ao signo verbal um lugar secundário. O sentido da palavra "poema" é tão ampliado que pode denominar uma passeata ou outra performance coletiva, bem como um objeto gráfico desprovido de letras ou palavras.







Poesia Concreta


A poesia concreta surgiu com o Concretismo, fase literária voltada para a valorização e incorporação dos aspectos geométricos à arte (música, poesia, artes pláticas). O poema do Concretismo tem como característica primordial o uso das disponibilidades gráficas que as palavras possuem sem preocupações com a estética tradicional de começo, meio e fim e, por este motivo, é chamado de poema-objeto.


Outros atributos que podemos apontar deste tipo de poesia são:

- a eliminação do verso;

- o aproveitamento do espaço em branco da página para disposição das palavras;

- a exploração dos aspectos sonoros, visuais e semânticos dos vocábulos;

- o uso de neologismos e termos estrangeiros;

- decomposição das palavras;

- possibilidades de múltiplas leituras.


Poesia Concreta


rua rua rua sol

rua rua sol rua

rua sol rua rua

sol rua rua rua

rua rua rua
Ronaldo Azeredo


Esse é um poema concreto. Para comunicar, uso o ideograma (sinal que exprime as idéias e não os sons), rompendo com o verso e a sintaxe tradicional. Não há sujeito, não há predicado. O poema tudo é elaborado com substantivos concretos, abolindo o verso e os sinais de pontuação. O apelo do poema é visual. E o que ele comunica? O movimento do sol, da aurora ao ocaso, sobre uma cidade.


Vanguardas Poéticas

Poesias Práxis
A vanguarda poética dos anos 50 e 60 que mais deu o que falar foi a poesia práxis. Como o nome sugere, a idéia central era construir poemas com base na prática da vida. O manifesto didático da poesia-práxis foi publicado em 1962, no livro de Mário Chamie, Lavra Lavra, em que estavam algumas premissas básicas do grupo. Os praxistas, abertamente contra o Concretismo, repudiavam a “estrutura matemática” do poema e afirmavam que o espaço em branco da página não era tão importante.
A poesia-práxis redescobre o verso como estrutura básica do poema, mas não da maneira tradicional. Sempre há uma palavra básica (ou palavras básicas) que funciona como vetor (orientação) das outras. O poeta busca, na prática, no dia-a-dia, o objeto do seu poema de tal forma que autor-objeto-leitor são os autores da obra.
Leia a seguir poemas de Mário Chamie:
POVO
um cardume sem dono
um ardume nos olhos
um friúme nos ossos.
uma frebeuma peste.
um fio de fumo
nos olhos do homem.
um fio de gume
no lombo de couro do pobre.
um corte sem rumo.
Xo cardume dos peixes do lucro:o azedume.
o ofício pro domo do dono
do couro no cume do custo do ouro.
PLANTIO
Cava,
então descansa.
Enxada; fio de corte corre o braço
de cima
e marca: mês, mês de sonda.
Cova.
Joga,
então não pensa
Semente; grão de poda larga a palma
de lado
e seca; rês, rês de malha.
Cava.
Calca
e não relembra.
Demência; mão de louco planta o vau
de perto
e talha: três, três de paus.
Cova.
Molha
e não dispensa.
Adubo;pó de esterco mancha o rego
de longo
e forma: nó, nó de resmo.
Joga.
Troca,
então condena.
Contrato; quê de paga perde o ganho
de hora
e troça: mais, mais de ano
Calca.
Cova:
e não se espanta.
Plantio; fé e safra sofre o homem
de morte
e morre: rês, rés de fome
cava.
SIDERURGIA S.O.S.
Se der o ouro sidéreo opus horáriO
Sem sol o sal do erário saláriO
Ser der orgia semistério o empresáriO
Siderurgia do opus o só do eráriO
Se der a via do pus opus erradO
Se der o certo no errado o empregadO
Se der errado no certo o emprecáriO
O TOLO E O SÁBIO
O sábio que há em você
não sabe o que sabe
o tolo que não se vê.
Sabe que não se vê
o tolo que não sabe
o que há de sábio em você
Mas do tolo que há em você
não sabe o sábio que você vê.